O Nascituro de Maria

Silma Mendes Berti*

Nascituro é o ser concebido, durante o tempo em que se encontra no seio materno que o acolhe e o protege.
Impossível falar de Nascituro sem invocar Maria, a mulher mais louvada.
É no relato da Anunciação, a página mais emocionante da Bíblia, que Lucas apresenta a Virgem no cenário da vida humana. E o faz com matizes literários e teológicos.

O anúncio a Maria

No sexto mês, o anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galiléia chamada Nazaré a uma virgem prometida em casamento a um homem de nome José da casa de Davi; e o nome da virgem era Maria.

Entrando onde ela estava, disse: “Alegra-te, cheia de graça, o Senhor está contigo!” (Lc 1, 26-29). Ao ouvir o mais surpreendente anúncio-vocação dos lábios de um mensageiro divino, Maria reage, e, dialogando, serenamente, perturba-se, não com a presença do anjo, mas com o sentido das palavras dele. Procura “entender o motivo pelo qual fora agraciada por Deus, a ponto de receber dele o nome cheio de graça.” O anjo, porém, acrescentou: “Não temas, Maria! Encontraste a graça, junto de Deus. Eis que conceberás em teu seio, e darás à luz um filho, e tu o chamarás com o nome de Jesus. Ele será grande, será chamado Filho do Altíssimo, e o Senhor Deus lhe dará o trono de Davi, seu pai; ele será reinará na casa de Jacó, para sempre e o seu reinado não terá fim.” (Lc 1, 30-33)

“Não temas!” expressão tranquilizadora que figura e ressoa por toda a história do Evangelho. O anjo Gabriel a pronunciou, dirigindo-se a Zacarias, antes de nascimento de João Batista. (Lc 1, 13) O mesmo anjo Gabriel repetiu a Maria, antes do nascimento de Jesus. (Lc 1,30) O anjo diz isto às mulheres que foram ao túmulo de Jesus, (Mt 28,5). E o próprio Jesus também a pronunciou quando apareceu aos discípulos, (Mt 28,10) para anunciar o Deus do Amor, da Alegria e da Paz.

Na resposta do Anjo a Maria, insere-se o anuncio da Encarnação. Maria não foge ao chamado, mas apresenta ao Anjo um obstáculo: “como é que vai ser isso, se eu não conheço homem algum? (Lc 1, 34). O anjo lhe respondeu:” O Espírito Santo virá sobre ti e o poder do Altíssimo vai te cobrir com sua sombra, por isso o Santo que vai nascer, será chamado Filho de Deus (Lc 1, 35).

Maria não recebe um Filho concebido com a participação natural do homem, mas mediante uma intervenção especial de Deus. Um filho que recebe dela a natureza humana, permitindo o Filho de Deus humanizar-se: “E o verbo se fez carne.” (Jo 1,14). Maria, ponto de união entre o Céu a terra. Nem por um instante a Virgem duvidou que Deus pudesse fazer o que o Anjo lhe anunciara. E não pediu prova alguma. Mas o Anjo lhe ofereceu um sinal: “Também Isabel, sua parenta, concebeu um filho na velhice, e este é o sexto mês, para aquela que chamaram de estéril. Para Deus, com efeito, nada é impossível.” (Lc 1, 36,37)

O Sim de Maria

A resposta de Maria foi uma esplêndida profissão de fé: “Eu sou a serva do Senhor: faça-se em mim segundo a sua palavra!” E o anjo a deixou (Lc 1, 38).

Primeira Comunhão de Maria

Maria recebe em suas entranhas o Verbo feito carne. Eis o Nascituro de Maria! Ali ganha morada o Corpo de Cristo. Primeira Comunhão da Virgem Maria: Primeira Comunhão do mundo. Primeira vez que uma criatura humana hospeda dentro de si, e desta vez sem o véu das espécies sacramentais, o Corpo de Cristo, segundo afirma o Salvador M. Iglésias: O Evangelho de Maria. São Paulo: Quadrante, 1991, p. 82.
Apenas Maria, sobre a terra, soube o momento em que o Verbo se fez carne e habitou entre nós (Jo 1, 14). Inexiste, portanto, registro de elemento natural ou artificial. Com efeito, ser Mãe de Deus é o centro de tudo. Para ser Mãe, e, por ser Mãe, tudo acontece. Para ser o habitáculo do Altíssimo é Maria concebida sem pecado. Daí dizer-se que ela concebeu antes na mente do que no corpo, um dar de si, de sua própria substância para a vida de seu Divino Filho, o Redentor do mundo. A palavra de Deus reduziu-se ao silêncio completo, durante nove meses no seio virginal de Maria.

Na maternidade, uma particular riqueza do encontro do FILHO-MÃE. Nenhum filho escolhe sua mãe. Todo filho é concebido, vive no ventre materno seu desenvolvimento, e, no momento certo, é dado à luz. A mãe o acompanha em toda a sua trajetória, com a mais amorosa expectativa. Com Maria foi diferente. Escolhida por seu Filho, ela viveu, o momento do SIM, um encontro com ÊLE.

A visita a Isabel

Naqueles dias, Maria pôs-se a caminho para a região montanhosa, dirigindo-se apressadamente a uma cidade de Judá. (Lc 1, 39)

É fácil imaginar os sentimentos de gratidão que povoam a alma de Maria, diante da bondade de Deus! Como Ação de Graças pela sua Primeira Comunhão, quis praticar uma obra de misericórdia à prima.

Maria, verdadeira expressão de bondade, decide, então, visitar Isabel. E pode-se imaginá-la ajuntando-se a alguma caravana de peregrinos que vão à Jerusalém, passando por Samaria para atingir AIN KARIN, cidade de Judá, onde vive a família de Zacarias.

Primeira Procissão de Corpus Christi

Ela transita piedosamente com o filho no ventre. É portadora do Senhor e do seu Espírito à casa de Isabel. Primeira vez que o Verbo feito carne passeia pelos caminhos do mundo, oculto num Sacrário Vivo. Primeira Procissão de Corpus Christi!
Tudo é igual, menos o passo, pois, nos dizeres de Lucas, a Virgem ia apressadamente sem a solenidade litúrgica do passo da procissão mas, segundo Iglésias, com a presteza que lhe infundira a urgência do amor. É preciso fazer o bem. E bem depressa.
“Entrou na casa de Zacarias e saudou Isabel. Ora, quando Isabel ouviu a saudação de Maria, a criança lhe estremeceu no ventre e Isabel ficou repleta do Espírito Santo.
[…]
E, feliz e honrada, exclama: Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto de teu ventre! Donde me vem que a mãe do meu Senhor me visite? Pois quando a tua saudação ressoou aos meus ouvidos, a criança estremeceu de alegria em meu ventre.” (Lc 1, 40-44)
Da Comunicação entre Nascituros
Lucas não registrou as palavras com que Maria saudou a prima, mas apresenta, em narrativa de elevada beleza evangélica, a primeira comunicação de que se tem registro na história da humanidade, entre dois Nascituros de mães diversas: João, filho de Isabel. E Jesus, filho de Maria. (Lc 1, 41-44)

E ressalta que Isabel proclamando a maternidade física de Maria, valoriza e eleva essa maternidade, ao reconhecer que o filho de Maria é seu Senhor. É o Primeiro Texto de Aclamação a Maria, como mãe do Senhor. (Lc 1,44)
Ao canto de Isabel, Maria responde com o Magnificat, o mais longo texto bíblico por ela pronunciado, dirigido não à prima Isabel, mas a Deus: oração em forma de hino e cântico. Portanto, no Magnificat rezamos como e com Nossa Senhora, em
………………………. …………………………………………………………………………………………….
*Membro do Comitê de Bioética da Arquidiocese de Belo Horizonte – Minas Gerais
*Membro do Tribunal Eclesiástico da Arquidiocese de Belo Horizonte – Minas Gerais
*Professora Aposentada na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
Agradecimento e em louvor a Deus pelas maravilhas em favor dos mais humildes. E louvamos a Deus por ter escolhido Maria para mãe do Salvador.
S.M. Iglesias escreveu em O Evangelho de Maria:
…quase sempre, por trás do Evangelho de Jesus encontra-se Maria!
De Maria nunquam satis

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Bioética: 50 anos e Covid-19

Prof. Dr. Pe. Rogério Jolins Martins1

A bioética surgiu em 1971 com a obra Bioethics: bridge to the future2 (Bioética: ponte para o futuro) do bioquímico e professor de oncologia Van Rensselaer Potter, da Escola Médica da Universidade de Wisconsin, com o objetivo de discutir os limites do conhecimento técnico-científico gerado nas décadas anteriores, sobretudo a partir da Segunda Guerra Mundial. Propunha-se estabelecer “pontes” entre os saberes biológicos, médicos, jurídicos e humanos em nome da necessária sobrevivência na terra. As demandas sentidas por Potter já tinham sido percebidas por Fritz Jahr3 (1895-1953), quando em 1927, dando conta do cansaço da razão moderna, propôs falar da necessidade de uma narrativa que contemplasse não estritamente o antropos, mas todas as formas de vida existentes no planeta, também os animais, as plantas e a natureza como um todo. Essa nova narrativa, na sua origem, buscou interpretar conflitos surgidos do cotidiano hospitalar e as situações que emergiram no campo técnico-científico, sendo desse modo designada por muitos como uma ética aplicada. Dentre os muitos dilemas que se tornaram públicos e levaram ao debate, em contexto internacional, em 1962, está a publicação de um artigo de Shana Alexander, na revista Life Magazine, intitulado “Eles decidem quem vive e quem morre”4, referente à responsabilidade médica a que cabia decidir os pacientes que teriam acesso às poucas máquinas para diálise e as muitas demandas de pessoas com insuficiência renal. Criou-se com isso um Comitê de Admissão e Políticas do Centro Renal de Seattle com o objetivo de interferir na alocação de recursos de saúde e definir critérios de seleção de pacientes para tratamento, dada a limitação dos recursos disponíveis.

Esse Comitê formado por especialistas em algumas áreas do conhecimento e representantes da sociedade organizada assumiu desde então a responsabilidade pelas decisões que deveriam ser de domínio público. Dessa forma, a decisão pela vida ou pela morte não se restringiria mais somente aos médicos, mas ao domínio público, marcando assim o rompimento com a tradicional ética médica, caracterizada até então como muito paternalista. Muitos outros casos que estavam ocorrendo foram trazidos para o debate dessa nova concepção teórico-metodológica. Por exemplo, aconteceu, em 03 de dezembro de 1967, quando o médico Dr. Christian Barnard realizou o primeiro transplante de coração, na África do Sul, desencadeando, sob o impacto da nova descoberta, a necessidade de se redefinir o conceito de morte de “parada cardiorrespiratória” para “morte cerebral”.

Essa nova definição para “morte” entrou em vigor em 05 de agosto de 1968, com a publicação de “A definition of irreversible coma: report of the ad hoc Committee at Harvard Medical School to examine the definition of brain death”5. Merece citar ainda o Relatório Belmont6, publicado em 1978, como resposta do governo estadunidense que, mesmo após a publicação das sentenças do Tribunal de Nuremberg, em 1947, para julgar os experimentos nos campos de concentração nazistas, continuou fazendo experimentos em seres humanos de forma eticamente reprovável, como no caso da sífilis e outros, que causaram um estado de comoção da comunidade internacional, por terem tomado como cobaias indivíduos vulnerados. Esses feitos levaram os EUA a instaurar uma comissão de proteção à pessoa, a qual identificou os princípios do respeito à pessoa, da beneficência e da justiça que deveriam conduzir os experimentos realizados de ora em diante. Esses feitos e novas descobertas no campo técnico-científico despertaram em algumas nações e na comunidade científica a necessidade de formar sistemas de avaliação ética para pesquisas, que se serviram dos princípios do Relatório de Belmont como base, e se disseminaram rapidamente para o mundo inteiro com congressos e publicações realizadas pelas mais diversas áreas do saber, além de cursos em nível de pós-graduação lato e estrito sensu, com o objetivo de contribuir nas decisões a serem tomadas.

A análise para as tomadas de decisões não tem por objetivo inibir as novas descobertas, mas iluminar para que as aquelas sejam mais assertivas. A recepção desse marco teórico no Brasil se deu efetivamente com a realização do VI Congresso Mundial de Bioética, em 2002, em Brasília, quando abordou o tema “Bioética, poder e injustiça”. O Congresso trouxe para o debate questões fora do âmbito clínico biomédico de tradição estadunidense, implicando que a bioética não deveria tratar de problemas importados de outros povos, mas que deveria refletir sobre eles de forma situada. A partir daqui o debate em bioética se ampliou e retomou o seu propósito originário, o qual seria estabelecer uma ponte entre as mais diversas formas de vida, precisando considerar também os fatores sociais e ambientais. Um acontecimento decisivo para a direção da bioética nesse sentido foi a publicação da “Declaração Universal de Bioética e Direitos Humanos”, da UNESCO, em 20057. Esse instrumento começou a tratar a bioética não como única, mas uma narrativa com diversas tendências e realidades nela contempladas. Os próprios princípios do Relatório Belmont, logo após sua publicação, sofreram alteração pela necessidade de contemplar outros referenciais como a não maleficência, a alteridade, o cuidado, a libertação, a solidariedade, a responsabilidade, etc. que dessem conta das realidades em que a análise bioética era feita. Os dilemas tratados de forma bioética precisam considerar a complexidade das demandas à luz da pluralidade dos conhecimentos, de gêneros, de políticas no que se refere a leis e recursos, das sociedades, de valores morais, etc.

O debate quando abrange questões relevantes requer que todos os envolvidos tenham disposição e competência para a discussão. É assim que a bioética neste ano de 2020 dá sua contribuição para o momento grave que a humanidade toda vive, apreensiva com a pandemia provocada pela disseminação do vírus covid-19. Mesmo com o rápido contágio e a alta letalidade nas sociedades, a bioética questiona as mais diversas reações frente à gravidade da pandemia por parte de governos, instituições e segmentos sociais. Essas reações diversas pouco representam a multidisciplinaridade, pressuposto básico da bioética, uma vez que a relevância da pandemia requer que alguns referenciais tais como a não maleficência, a responsabilidade, o respeito à pessoa, a beneficência, a justiça, o cuidado, a solidariedade e outros deveriam ser ponderados, quando na verdade estão sendo ignorados.

A forma como o governo brasileiro, em específico, tem tratado esta realidade é tão séria, a começar pelo seu desprezo à vida, às relações, ao contributo das ciências e das instituições de maior representação da sociedade civil. Muito tumulto se gerou com argumentos falaciosos que buscaram confundir a opinião pública sobre o status da vida humana na relação com economia, politizando uma situação já demasiadamente complexa. Em meio a tal conflito, a bioética de tendência personalista desfaz esse falso dilema ao lembrar que a vida está intrinsecamente relacionada à economia, mas tem precedência a ela e não o inverso. A manchete publicada por Shana Alexander, “Eles decidem quem vive e quem morre”, passou a ter atualidade aqui sob novo tempo, novo contexto, no que tange à administração das vidas. É nesse contexto que se deu o importante posicionamento bioético com O pacto pela vida e pelo Brasil8, publicado no dia 07 de abril de 2020, ainda no início da pandemia, que buscou despertar a consciência ética de todos os cidadãos desta Nação para a necessária preservação da vida e da dignidade de todos. Esse instrumento recorda as responsabilidades dos agentes do Estado brasileiro e de cada indivíduo para o compromisso, sobretudo com os mais desprotegidos: “ninguém seja deixado para trás”, pois, como diz o Papa Francisco, “ninguém pode ser saudável em um mundo doente”9.

A bioética comemora seus cinquenta anos com várias contribuições dadas às sociedades do seu tempo, e se torna imprescindível quando se observa grande intolerância por parte de pessoas mais preocupadas com a estética, o poder e com a instrumentalização dos valores, desdém às causas sociais e humanas, e mesclados com um fundamentalismo que dá pouco espaço à razão. Em meio às tantas situações do cotidiano que se apresentam aos indivíduos e à coletividade que requer uma análise bioética, para medidas mais assertivas, recobra-se aqui outro caso recente de comoção nacional da gravidez precoce de uma garota de dez anos estuprada pelo tio no Estado do Espírito Santo. Após esse caso ser amplamente explorado pela grande imprensa, começaram a aparecer os muitos outros que são praticados no cotidiano, e não evidenciados pelas famílias, pelos poderes públicos, pela imprensa, etc. Nessa época a Igreja Católica, servindo-se do Magistério de São João Paulo II, com a Carta Encíclica Evangelium Vitae, pronunciou que “causa horror só o pensar que haja crianças que não poderão jamais ver a luz, vítimas do aborto”.

A discussão bioética continua. Ela está presente nas implicâncias que envolvem as vacinas para imunizar as pessoas da covid-19 e em seus desdobramentos tais como: a concorrência entre as indústrias farmacêuticas e o acesso a essas vacinas por parte das nações pobres e endividadas. Para agravar a situação é constatado que a covid-19 tem seus efeitos mais nefastos entre os mais pobres, sem garantias de proteção. A bioética analisa essas e aquelas questões que surgirão no pós-pandemia. Sabe-se que o valor da vida humana deve ser anteposto a todas as outras necessidades, não de modo separado, mas como um todo integrado. A bioética é fruto do seu tempo; é laica e, portanto, secular. Ela está para lançar luz mediante discernimentos necessários, cabendo para isso o difícil exercício da escuta e suas ponderações. Em meio às tantas discussões que lhe são pertinentes, é ainda comum haver disputas, lobbys e interesses escusos que atrapalham por vezes a tomada de atitude mais adequada. Em todo caso, é preciso que os interlocutores da discussão não fiquem calados. Exemplo de uma dessas vozes foi a manifestação da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) no caso da criança violentada sexualmente citada acima: “Lamentável presenciar aqueles que representam a Lei e o Estado, com a missão de defender a vida, decidirem pela morte de uma criança de apenas cinco meses, cuja mãe é uma menina de dez anos. Dois crimes hediondos. A violência sexual é terrível, mas a violência do aborto não se explica…”10. Em meio às situações micro e macro das sociedades, a bioética dá sua contribuição sem imposições ou desejo de obter a verdade.

 

1 Presbítero da Arquidiocese de Belo Horizonte. Professor contratado no departamento de Filosofia da PUC Minas. Membro do Comitê de Bioética da Arquidiocese de Belo Horizonte.
2 POTTER, V.R. Bioethics, bridge to the future. Englewwod Cliffs, N.J.: Prentice-Hall; 1971.
3 JAHR, F. Bio-Ethic: eine umschau über die ethischen. Beziehungen des menschen zu tier und
pflanze. Kosmos. Handweiser für Naturfreunde. 1927;24(1):2-4.
4 ALEXANDER, Shana. They Decide Who Lives, Who Dies. LIFE magazine, November 1962. Disponível em: http://www.nephjc.com/news/godpanel. Acesso em 23 de setembro de 2020.
5 BARNARD, Christiaan. A definition of irreversible coma. Report of the Ad Hoc Committee of the Harvard Medical School to examine the definition of brain death. JAMA. 1968; 205:337–340. Disponível em: https://link.springer.com/article/10.1007/s12028-018-0579-8?shared-article-renderer. Acesso em 23 de setembro de 2020.
6 THE BELMONT Report. Ethical Guidelines for the Protection of Human Subjects. Washington: DHEW Publications (OS) 78-0012, 1978. Disponível em: https://www.hhs.gov/ohrp/regulations-and-policy/belmont-report/read-the-belmont-report/index.html. Acesso em 23 de setembro de 2020.
7 ORGANIZAÇÃO das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura. Declaração universal sobre
bioética e direitos humanos. [Internet]. Paris: Unesco; 2005. Disponível em: https://www.ufrgs.br/bioetica/undh.htm. Acesso em 23 de setembro de 2020.
8 CNBB. O pacto pela vida e pelo Brasil. 07 de abril de 2020. Disponível em: https://www.cnbb.org.br/no-dia-mundial-da-saude-cnbb-assina-pacto-pela-vida-e-pelo-brasil/. Acesso em 23 de setembro de 2020.
9 PAPA FRANCISCO. CARTA do Papa Francisco ao presidente da Colômbia por ocasião do dia mundial do meio ambiente. Disponível em: http://w2.vatican.va/content/francesco/pt/letters/2020/documents/papa-francesco_20200605_lettera-giornata-ambiente.html. Acesso em 23 de setembro de 2020.
10 CNBB. Pela vidam contra o aborto. Disponível em: https://www.cnbb.org.br/posicao-da-cnbb-em-defesa-da-vida-humana-e-contra-o-aborto/. Acesso em 23 de setembro de 2020.

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O coração do brasileiro pede socorro

Apesar de uma crise de saúde global sem paralelo na história moderna estar nos afligindo há 6 meses, ainda não existem medidas profiláticas comprovadas além do isolamento social, uso de máscaras e lavagem constante das mãos. Para as pessoas de maior risco como cardiopatas, diabéticos, obesos e idosos, a recomendação do isolamento é mais rigorosa.

Há uma necessidade urgente de somarmos nossos esforços e orações para otimizar a resposta da comunidade e do serviço médico para a conservação da vida, reduzindo o impacto físico e mental na saúde. Não deve haver uma divergência entre a saúde pública e a economia; na verdade, elas devem estar interligadas. Estratégias de uma política pública forte reduz a progressão da pandemia e protege a economia.

A Bioética como um estudo transdisciplinar entre ciências biológicas, ciências de saúde, filosofia e direito, que estuda e investiga as condições necessárias para uma administração responsável da vida humana, animal e ambiental, deve estar em alerta principalmente em tempos de pandemia. “A Cardiologia brasileira tem bagagem científica para reivindicar uma identidade bioética nacional, abrangendo nosso pluralismo étnico, cultural e econômico”, segundo afirma Dr. Max Grinberg cardiologista do Incor – SP.

Pacientes cardiopatas, principalmente os que já tiveram Infarto ou Insuficiência Cardíaca pertencem ao grupo de maior risco. Existe uma predisposição para desenvolver a forma mais grave da COVID – 19 provavelmente por alterações em seu sistema imunológico além de um estado inflamatório crônico latente. A obesidade que pode ser adquirida ou aumentada com o isolamento é outro fator agravante desta patologia. Uma meta -análise mostrou que o obeso apresenta 48% a mais de chance de contrair as formas graves da COVID – 19.

Ainda não existe tratamento ficaz e as medidas preventivas já citadas, principalmente o isolamento social, são a melhor estratégia para os pacientes do grupo de risco. Contudo, isto pode acarretar prejuízos para o cardiopata, favorecendo o sedentarismo e a obesidade, fatores de risco importantes já consagrados para o desenvolvimento de doenças do coração. O medo de contágio pode retê-los em casa. Os sintomas de um Infarto do Miocárdio ou da Insuficiência Cardíaca podem ser mascarados pelos sintomas da COVID – 19. Por estes motivos, é importante que os pacientes cardiopatas sigam os tratamentos prescritos por seus médicos comparecendo regularmente às consultas. A procura dos serviços de urgência frente à ocorrência de sintomas ou agravamento da doença deve ser encorajada. Contudo, para que isto possa acontecer, é necessário que nosso serviço médico esteja funcionando adequadamente, principalmente o SUS que atende nossos irmãos menos favorecidos. A estrutura é boa, mas geralmente faltam recursos necessários para um funcionamento adequado. O fortalecimento do SUS com uma gestão correta dos recursos, sem desperdícios ou desvios é um princípio da Bioética que devemos praticar, fiscalizar e denunciar, em nome da preservação e da dignidade da vida. O combate à corrupção deve constar deste “Pacto pela vida e pelo Brasil”. O vírus da corrupção há muito contagia o nosso Brasil e é uma das causas que prejudica a saúde principalmente da nossa população mais carente.

Estratégias de política pública forte incluindo o combate à corrupção reduz a progressão da pandemia e protege a economia. Existe um novo projeto anticorrupção elaborado por 200 especialistas estacionado no Congresso que deveria ser levado à discussão e apoiado por todos nós que estamos empenhados na preservação da vida.

Rezemos para que no Brasil reine a paz, a justiça e a solidariedade para sermos realmente um país livre e feliz.

O coração do Brasil agradece!

Dr. Ernani Furletti Lages
Sócio Remido da SBC
Membro do Comitê de Bioética da Arquidiocese de Belo Horizonte
Chefe do Serviço Médico do Ambulatório da Paróquia Nossa Senhora Rainha

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Vidas de idosos importam:  o pacto pela vida é para todos

Estamos todos no mesmo barco?

A etimologia da palavra pandemia diz que sim. Unem-se duas palavras gregas pan (todo) e demos (povo), com o sentido de “todo o povo”. No entanto, a pandemia não é cega. Ela vê condições prévias de saúde e faixa etária, e delas se aproveita.

A Organização das Nações Unidas (ONU) informou, neste ano de 2020, que em 2030 o número de pessoas idosas será de 1,4 bilhão. Esse número aumentará para 2,1 bilhões, no ano de 2050, em todas as regiões do mundo à exceção da África.

A ONU também informou que em 2050 o número de pessoas idosas será muito maior, cerca de 80%, em países menos desenvolvidos do que na Europa, que, atualmente, representa 25% da população idosa.

Ora, se os números apontam para o aumento do envelhecimento, o óbvio seria atentar para a busca de políticas específicas, eficientes e sustentáveis, com preceitos éticos claros, de forma a garantir a dignidade dessa população tão vulnerável.

O novo coronavírus tem feito seus estragos, mas também tem desmascarado barbáries naturalizadas por uma sociedade muito mais preocupada com o ter do que com o ser. Quem deve viver nesse cenário de alocação de recursos escassos? O jovem, que tem uma vida pela frente e que pode contribuir com seu trabalho, ou o idoso, que já viveu “o suficiente” e, por isso, pode abrir mão de um ventilador em benefício daquele? Questionamentos como esses foram veiculados na mídia e o espaço que eles ganharam, durante todos esses meses, nos leva, forçosamente, a pensar na ideia da prescindibilidade da vida do idoso.

É certo que temos, hoje, um número mais expressivo de normativas internacionais e nacionais de proteção ao idoso, no entanto, sua implementação ainda deixa muito a desejar. De nada adianta a criação de normas se não houver políticas públicas adequadas e a conscientização de todos sobre a necessidade de seu cumprimento. É como arremessar palavras ao vento.

As indagações acima foram acompanhadas de casos ao redor do mundo, em que velhos foram confrontados com perguntas sobre quererem ser levados a uma UTI para serem intubados, ou se preferiam cuidados paliativos, a fim de dar espaço para os mais jovens. Sendo a resposta voltada pela liberação de sua vaga, a atitude era festejada ao argumento de que o altruísmo lhes movia. Ora, que proposta é essa? A de dizer-lhes que simbolicamente já estavam mortos? A de lhes mostrarem que são um peso?

Não se pode banalizar a vida humana. A Constituição da República de 1988 traz, como fundamento, a dignidade da pessoa humana e proíbe, em seu artigo 5º, toda forma de discriminação. E, nesse contexto, o pacto pela vida é pela vida de todos.

As medidas tomadas pelas equipes de saúde, em contexto de pandemia devem ser motivadas, atentando para as evidências científicas, com clareza e transparência, sem perder de vista os dilemas morais envolvidos.

A abordagem da saúde do idoso deve partir de uma perspectiva ampla, não apenas sob o ponto de vista biológico, mas também psicológico e existencial. Na pandemia, a fragilidade se mostra com múltiplas dimensões para todas as pessoas, sobretudo daquelas hipervulneráveis, porquanto a peculiaridade da situação não pode servir de fundamento para se excepcionar a pessoa idosa na assistência à saúde, simplesmente em razão de sua longevidade.

Equidade e solidariedade devem nortear a implementação de políticas públicas. Viver mais não pode ser um castigo a justificar discriminação.

Voltando a pergunta inicial: estamos todos no mesmo barco? A resposta pode ser positiva se pensarmos nesse novo tempo tão exigente em que despedidas são mitigadas, em que a morte ronda a vida. Por isso, resta-nos trazer aqui uma expressão muito trabalhada pelos estoicos: Memento mori. Lembremos de que somos mortais, lembremos de que vamos morrer, lembremo-nos da morte.

 

Maria de Fátima Freire de Sá

Professora da PUC Minas

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Valorizar a vida nos hospitais: a Pastoral Hospitalar

A Pastoral da Saúde, no sentido mais aberto, existe desde a década de 1980 como organismo da ação social da CNBB.

A Pastoral Hospitalar da Arquidiocese de Belo Horizonte nasceu a partir de um olhar mais atento à misericórdia e justiça de Deus, instituída em 2011 pelo nosso arcebispo Dom Walmor Oliveira de Azevedo, para levar assistência religiosa e conforto espiritual aos enfermos hospitalizados, no desejo que “todos tenham vida e a tenham em plenitude”.

Hoje em dia, os tratamentos ambulatoriais visam aquelas condições de saúde que não oferecem risco maior, de diagnóstico e tratamento possíveis nesta situação ou o acompanhamento de doenças graves e estáveis.

Os pacientes hospitalizados, normalmente, são pacientes cuja vida corre perigo, que estão instáveis, necessitam procedimentos diagnósticos ou terapêuticos mais complexos, cirurgias, CTI, etc.

Tais pacientes hospitalizados estão fora do seu convívio domiciliar, em situação de ansiedade pela vida que corre algum perigo, insegurança pelo desenrolar ou desfecho da sua enfermidade.

Daí necessitarem de um cuidado especial, de um apoio espiritual humano e fraterno, além dos cuidados médicos habituais.

A crença e a fé destas pessoas podem vacilar porque a saúde delas está, por hora, instável ou pouco definida.

Nosso Arcebispo, com a sua vivência junto aos necessitados de saúde, percebeu que a Diocese poderia fazer-se mais presente nestes lugares específicos de Clínicas e Hospitais, de forma mais coordenada e controlada.

Desta forma, a provisão de assistência hospitalar foi dada a dois diáconos permanentes (Paulo Taitson e Cid Ferreira) para que pudessem organizar esta assistência na Diocese, tendo em vista que muitos hospitais não dispunham de capelães.

Hoje mais de quarenta clínicas e hospitais, conforme o site da Diocese, dispõem de capelão (padre ou diácono) bem como a referência de um bispo auxiliar.

O papel dos diáconos permanentes responsáveis pela Pastoral Hospitalar é zelar para que estas instituições não fiquem sem assistência sobretudo em época de substituições, nomeações ou mudanças de padres, reportando ao Sr. Arcebispo as necessidades e os resultados.

Apesar de cada hospital contar com capelão (padre ou diácono) designado ou responsável, eles possuem horários para o atendimento de suas funções que, normalmente, não são as únicas. Daí que todo clérigo deve colaborar com a assistência religiosa hospitalar, sobretudo de seus paroquianos, quando solicitados.

Todas as instituições listadas no site da Pastoral Hospitalar da Arquidiocese de Belo Horizonte contam com a visita semanal aos enfermos por equipe própria de ministros extraordinários da Eucaristia, celebrações litúrgicas da Palavra ou missa, bênção, bem como confissão, unção dos enfermos quando solicitado e até batizados de emergência.

É de suma importância salientar a relevância do trabalho das equipes de ministros da Eucaristia, que visitam semanalmente todos os pacientes internados. Boa parte dos pacientes é católica e fica muito consolada com a oração e o recebimento da Eucaristia. Quando são de outra denominação religiosa ou sem religião definida os pacientes, normalmente aceitam a visita fraterna e a oração que trazem conforto, confiança e esperança.

Certa ocasião, um paciente em determinado hospital recebeu a visita de um ministro da Eucaristia, que ele não esperava. A pessoa apresentou-se e perguntou ao paciente se ele era católico e se desejava receber a Eucaristia. Ele ficou tão feliz e agradecido com o acontecido que, segundo ele, não sentiu dores e teve alta antecipada porque a sua evolução foi melhor do que a esperada.

Esse cuidado espiritual especial com os pacientes hospitalizados tem ajudado na humanização destes espaços terapêuticos, criando uma atmosfera de conforto espiritual, de confiança, menor angústia, menor ansiedade e serenidade.

Em determinada maternidade, o trabalho conjunto dos psicólogos e do diácono designado tem trazido mais alegria, mais aceitação das perdas, mais conforto diante do inesperado.

Em outro hospital com internações e atendimentos de urgência o atendimento pastoral tem ajudado aos familiares, ao paciente e a equipe de saúde da instituição minorando as dores, as incertezas e os insucessos.

Os diretores e chefias destes hospitais percebem que a assistência espiritual e de conforto dão uma tônica diferente à instituição, produz tendência a diminuir as complicações, aumenta a colaboração e a compreensão por parte dos pacientes e familiares.

Deste modo, a pastoral hospitalar contribui para reduzir as complicações, reduzir o tempo de internação e contribui para a humanização destes locais.

Acompanhando e vivenciando o comportamento e o testemunho dos pacientes, acompanhantes, cuidadores, familiares, bem como dos funcionários e de outras pessoas ligadas hospital, acabam por colaborar e participar deste trabalho comunitário que dignifica a todos e valoriza a vida.

A defesa e o cuidado da vida, o conforto espiritual e a presença solidária da Igreja tem sido o destaque da Pastoral Hospitalar, respeitando a crença e a individualidade das pessoas, cuidando também dos familiares, dos funcionários e de toda a equipe de saúde de maneira harmônica e fraterna.

A Pastoral Hospitalar tem sido uma experiência frutuosa de evangelização, conforto espiritual e solidariedade levando Cristo aos carentes ou necessitados de saúde e contribuindo para a humanização dos hospitais e clínicas da Arquidiocese de Belo Horizonte.

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EUTANÁSIA E ORTOTANÁSIA

O que é preciso saber sobre cada uma delas

Em 2006, o Conselho Federal de Medicina editou a resolução 1.805, pela qual se torna permitido ao médico – com uma regulamentação bem detalhada – limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem artificialmente a vida de doentes em fase terminal de enfermidades graves e incuráveis, respeitada a vontade do enfermo ou, em seu impedimento, de seu representante legal.

Sobre o tema surgiram muitas discussões, as quais foram acirradas com a aprovação da Igreja Católica, através da CNBB, e a discordância radical de alguns setores da advocacia brasileira. Aliás, duas situações surpreendentes porque a Igreja Católica sempre é vista como conservadora e os advogados como um setor bastante avançado. Predominou a oposição da área de direito, culminando com a suspensão (temporária) da resolução do CFM.

Para melhor entender o significado e o alcance dessa resolução, é necessário conhecer, corretamente, o significado de alguns termos. Afinal, muitas pessoas ainda pensam que a aprovação foi dada à eutanásia, no que estão absolutamente equivocados.

A Eutanásia pode apresentar-se como um suicídio assistido ou como um homicídio dito piedoso. O primeiro, quando realizado pelo próprio enfermo, e o segundo, quando a ação letal é perpetrada por outra pessoa. Eutanásia tem origem grega, eu significando boa e tánatos, morte. Portanto, seu significado etimológico é “boa morte”. Tomando apenas por esse lado, pode-se perguntar: quem não deseja uma boa morte, para si mesmo e para as pessoas que ama? Entretanto, a eutanásia é mais do que isso. É o ato deliberado e objetivo tomado para retirar a vida de uma pessoa que está em grave possibilidade de um sofrimento intenso, ou já se encontra nele, em razão de alguma doença incurável. Portanto, é uma ação direta e específica para tirar a vida de uma pessoa que, necessariamente, não está em fase terminal. E isso a caracteriza, indiscutivelmente, como suicídio ou homicídio, dependendo de quem foi o autor da ação letal.

Já a ortotanásia tem como significado etimológico “morte certa”, tanto podendo ser interpretada como a morte para cuja ocorrência já não se tem qualquer dúvida ou, então, a morte correta, aquela que ocorre sem sofrimentos e com o paciente recebendo todo o conforto das pessoas que lhe são próximas. Sem dúvida, é um termo ambíguo, mas com ele se quer definir a condição em que a morte do enfermo não será artificialmente prolongada, utilizando-se recursos extraordinários da moderna tecnologia que, ao invés de proporcionar conforto e tranquilidade, impõe ao enfermo aparelhos, tubos e medicações, muitas vezes repletos de efeitos colaterais, desconforto, dor e sofrimento. Quando se detecta a inviabilidade terapêutica, suspendem-se aquelas que não lhe trazem benefícios genuínos, deixando que a morte ocorra pacífica e naturalmente.

Totalmente em oposição à eutanásia, na ortotanásia não se toma qualquer medida para tirar a vida do enfermo.

A esse procedimento, que há muito anos defendemos, demos o nome de autotanásia e, por haplologia, autanásia, em artigo publicado num periódico médico, no ano de 1992. E o fizemos porque o prefixo grego auto significa “por si mesmo”, sem a interferência de nada ou de ninguém. Assim, autanásia representa a humildade e a submissão da medicina à inexorabilidade da morte, deixando-a acontecer naturalmente, por si só, quando o resgate de uma vida digna se faz impossível. Não significa, de forma alguma, o abandono do paciente. Muito pelo contrário, pois sua exigência maior é o cuidado genuíno do enfermo, proporcionando permanente atenção às suas necessidades e alívio às suas dores ou sofrimentos. Mas também não é afogá-lo em medidas terapêuticas heroicas que, não lhe trazendo nenhum benefício, trarão um sofrimento maior, além de falsas

esperanças para a família, que, assistindo à lentidão do processo tanático, irá acreditar que o enfermo está melhorando, inclusive evoluindo para a cura. Somam-se a isso os custos elevadíssimos de tais procedimentos, que espoliam a família ou os planos de saúde, sem trazer qualquer benefício, senão para quem recebe tais proventos.

Isso posto, podemos afirmar que a autanásia – forma haplológica de autotanásia – é uma ação ética e moralmente correta, enquanto a eutanásia não, constituindo-se em indiscutível homicídio.

De outro lado, estão os defensores da eutanásia, que o são, ou por um total desconhecimento da psicologia do enfermo terminal, ou por serem visceralmente pragmáticos e sem uma perspectiva transcendental da vida, ou ainda pela incapacidade pessoal de lidar com as perdas e o sofrimento. Vejamos rapidamente cada uma dessas razões.

O enfermo terminal vivencia, no decorrer de seu processo patológico, diversas fases psicológicas. Uma delas, como as demais, superável por uma adequada assistência psicológica, é a raiva. Nela, à extrema revolta pela doença que o acomete, soma-se a dor física maltratada e, o que é pior, a dor emocional pelo abandono, pela falta de assistência, apoio e carinho de seus familiares, quando isso acontece. Nessas condições, o enfermo só quer uma coisa: a morte. Por isso pede a eutanásia.

A resposta não será, obviamente, conceder-lhe a morte rápida, mas os cuidados adequados, tanto para a dor física, hoje com possibilidades eficientes de alívio, quanto para o sofrimento emocional, através de uma assistência psicológica dada pela biotanatologia, para o enfermo e para seus familiares.

Uma vez suprido em suas necessidades de atenção, carinho e medicação sintomática – que constituem o que se chama de cuidados paliativos – o enfermo que antes solicitava a eutanásia, agora já não busca mais a morte. Essa é uma experiência que hoje já se encontra bastante sedimentada no mundo inteiro.

O pragmatismo, geralmente materialista, vê a pessoa e sua vida como algo apenas funcional. Se não está funcionando bem, acabe-se com ela. Principalmente se conservá-la resulta em grandes despesas para os que ficam ou, o que é ainda mais indesejável: impede a rápida divisão de uma possível e substanciosa herança. Age-se como se faz com um aparelho que já não funciona bem, nem tem conserto: joga-se no lixo. Mas o ser humano não é um aparelho, não é um boneco estragado, não é um objeto.

O último ponto é a nossa incapacidade de lidar com a dor e com o sofrimento. Se eles ocorrem em nós, buscamos rapidamente analgésicos ou tranquilizantes, não importa a sua verdadeira razão.

Queremos eliminar os sintomas, mesmo sem conhecer as causas. E, com certeza, mantendo as causas, voltarão os sintomas. E se acontece com os outros, fugimos de sua proximidade ou tratamos de silenciá-los.

Descobrindo-se o sentido da vida, a maravilha desse dom precioso que recebemos, sua fragilidade e sua inescrutável importância e significado, com certeza rejeitaremos toda e qualquer ação para se tirar a vida de alguém ou a nossa própria.

Seja lá por que razões e argumentações forem.

A vida é um presente insubstituível e, mesmo com grandes limitações, é única e irrepetível. Isso é suficiente para defendê-la de modo incondicional, desde a concepção até o seu último alento. Sem cortá-la violentamente, mas também sem prolongá-la artificialmente. Por razões como essas, o Conselho Federal de Medicina, mui sabiamente, baixou tal resolução, e, pelas mesmas razões, a CNBB deu a ela a sua aprovação. Afinal, tiveram o belíssimo exemplo de João Paulo II, que, diante da inexorabilidade da morte, recusou-se a ser submetido a tratamentos inócuos, porém caros e traumáticos.

Concluindo, a eutanásia fere o valor fundamental da vida, que é algo que não podemos criar do nada. Se não o podemos, também não podemos simplesmente suprimi-la.

Essa interdição ética e moral, com certeza, se aplica a todas as formas de homicídio, sejam os explícitos, que a todo o momento vemos nos noticiários da mídia, como as formas dissimuladas, tais como a fome, a miséria, a falta de eficiente atendimento médico-hospitalar pelo sistema governamental de saúde e tantas outras que, tal e qual balas perdidas, ceifam vidas, por vezes com requintes de verdadeira crueldade.

Já a autanásia – ou ortotanásia como costuma ser oficialmente denominada – é ética e moralmente válida, pois aceita o fluxo natural da vida, não induzindo nem apressando a morte, mas também não a prolongando artificialmente. Apenas respeita a sua inexorabilidade quando todos os recursos razoáveis da medicina se esgotaram, deixando prevalecer apenas a vaidade tecnológica de quem, sentindo-se deus, não aceita suas próprias limitações humanas.

Evaldo

A. D’Assumpção – médico, professor convidado de Tanatologia, Biotanatologia e Bioética da Faculdade de Ciências Médicas de MG e membro do Conselho Arquidiocesano Pró-Vida.

 

Destaque

“Em oposição à eutanásia, na ortotanásia não se toma qualquer medida para tirar a vida do enfermo, deixando a morte acontecer naturalmente, quando o resgate de uma vida digna se faz impossível” “A autanásia ou ortotanásia é ética e moralmente válida, pois aceita o fluxo natural da vida, não induzindo nem apressando a morte, mas também não a prolongando artificialmente”.

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Anencefalia

A medicina precisa avançar na pesquisa para determinar o real estado de consciência das crianças nascidas com deformações severas no encéfalo antes de serem definidas políticas sobre a interrupção da gravidez. “A anencefalia não é o mesmo que morte encefálica, porque uma pessoa que respira sozinha e que é amamentada pela mãe sem precisar de aparelhos está viva”. A ciência ainda encontra importantes desafios na caracterização e conceituação do feto anencéfalo. Anatomicamente, a anencefalia é a ausência do encefálo, estrutura maior do sistema nervoso central, formado pelo tronco encefálico (cerebral), cerebelo e cérebro.

Muitas vezes o diagnóstico de anencefalia é errôneo, indicando a presença do tronco cerebral, ainda que rudimentar…. Existem, por outro lado, níveis diferentes da falta do encéfalo, desde a ausência completa até a falta de algumas partes, relata o professor Paulo Taitson Ph.D. da Coordenação do Conselho Arquidiocesano Pró-Vida.

As médicas Irvênia

Luiza de Santis Prada e Marlene Rossi Severino Nobre, também se posicionam contrárias à antecipação do parto nos casos de anencefalia. Dedicada ao estudo da evolução do cérebro humano, a doutora Irvênia faz, constantemente, apresentações técnicas sobre o cérebro, de acordo com a neurociência. “Embora sejam utilizados como sinônimos, os termos cérebro e encéfalo não são sinônimos. O anencéfalo, a rigor, seria o indivíduo com a cavidade craniana completamente oca, mas não é isso o que acontece realmente nos casos de anencefalia, pois neles são preservadas, pelo menos, as partes mais profundas do encéfalo”, afirmou.

Segundo a médica, o feto anencéfalo tem consciência, mas não pode se expressar porque lhe faltam os instrumentos neurais compatíveis com essa forma de manifestação. Avaliou como equivocadas as opiniões que afirmam não haver possibilidade de vida do anencéfalo porque não há vida sem cérebro. “Essas opiniões não têm, metodologicamente, dentro do contexto da neurociência, nenhum embasamento. Pelo contrário, a neurociência vem demonstrar pelo seu conteúdo que o anencéfalo tem substrato neural para desempenho de funções vitais, o que contra-indica o aborto desse feto e contra-indica a disponibilização do anencéfalo recém-nascido para transplante de órgãos”.

Professor

Paulo Franco Taitson., M.Sc., Ph.D.
Adjunto de Anatomia Humana e Reprodução do ICBS/PUC Minas
Pós-Doutorado pela UFRJ

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O Que Cada Casal Deve Saber Sobre Células Tronco

A Igreja sabe que o Evangelho da vida, recebido do seu Senhor, encontra um eco profundo e persuasivo no coração de cada pessoa, crente e até não crente, porque se ele supera infinitamente as suas aspirações, também lhes corresponde de maneira admirável. Mesmo por entre dificuldades e incertezas, todo o homem sinceramente aberto à verdade e ao bem pode, pela luz da razão e com o secreto influxo da graça, chegar a reconhecer, na lei natural inscrita no coração (cf. Rm 2, 14-15), o valor sagrado da vida humana desde o seu início até ao seu termo, e afirmar o direito que todo o ser humano tem de ver plenamente respeitado este seu bem primário.

Sobre o reconhecimento de tal direito é que se funda a convivência humana e a própria comunidade política. Evangelium vitae – Ioannes Paulus PP. II – Carta Encíclica (1995.03.25).

A maioria dos cientistas sérios afirma que a vida começa com a fecundação do óvulo com o espermatozóide. Temos indiscutivelmente nova vida. Porque nada será desta célula inicial, outra coisa que não seja um ser humano.Na teologia cristã não existe alternativa entre Deus e o ser humano. Existe complementaridade e cumplicidade.

Defender o homem é adorar ao Deus verdadeiro e adorar a Deus se faz exaltando o humano como amplitude da criação. Não existe diferença. Existe tão somente uma relação de amizade. Deus vem ao encontro da criatura na pessoa do Filho Único, nascido do útero de uma mulher judia, numa data determinada em uma cultura especifica. Encontro perfeito. Doação sem medida.

O ser humano é imagem e semelhança de Deus (Gn 1,26). Não podemos, portanto INSTRUMENTALIZAR este homem. Significa escravizar. Significa tornar meu semelhante – imagem do Criador – um objeto a meu dispor. Possível é a pergunta: só porque o embrião ainda não pode dizer um sonoro ‘não’? A dignidade do ser humano se baseia na sua condição racional (Kant). O Cristianismo se apóia neste conceito porque a dignidade se torna vocação e realização na historia do ser humano. A condição histórica é a base da dignidade do ser humano. Hoje, nossa historia se encontra no entrave ou na encruzilhada de perceber que podemos manipular outros seres humanos. Isto deve nos questionar e fazer-nos rever nosso conceito do que seja verdadeiramente a humanidade.

Enfim, a vida – na Natureza, mas também no ser humano – oferece uma excelente metáfora para compreender QUEM É DEUS. Todas as religiões relacionaram a defesa da vida com a vontade de seu deus. Adorar a Deus é exaltar a beleza e a inconfundível arte de viver! Saborear seus aromas no contato com o outro, mesmo quando o sabor da tolerância parece amargo ou meio ácido… Para que a dignidade do ser humano, sejamos príncipes ou plebeus, não seja desonrada nem ontem, nem hoje e nem nunca!

O Supremo Tribunal Federal votou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adi), que buscava impedir o uso de células–tronco embrionárias humanas em pesquisas no Brasil. Até os dias de hoje, a literatura científica mundial não evidenciou, de maneira conclusiva, que as células tronco-embrionárias são mais efetivas para a solução de diversos problemas levantados quando comparadas às células adultas ou mesmo quando comparadas com células tronco embrionárias de embriões não viáveis! Antes de tudo, a Igreja não é contra a pesquisa com células-tronco, pelo contrário, a Academia Pontifícia para as Ciências considera essas pesquisas benéficas à humanidade e certamente as estimula.

As células-tronco adultas estão presentes na medula óssea, sangue, fígado, cordão umbilical e etc., mas até o momento as pesquisas não avançaram o suficiente para que já se saiba em quais tipos de células as células-tronco adultas podem se transformar. Sabe-se da sua capacidade de replicação, mas desconhecem quais são suas limitações quanto a transplantes e quanto a doenças genéticas. Ou seja, serão necessários esforços de pesquisa mais prolongados e investimentos de longo prazo até que uma terapia eficaz com essas células apresente resultados. Mas em se tratando de pesquisa científica, qualquer fato novo, qualquer nova descoberta pode modificar completamente o quadro atual, e muitas etapas poderão ser superadas num curto espaço de tempo.

Muito por preconceito contra as posições corajosas assumidas pela Igreja em defesa da vida, a imprensa mundial alardeou a falsa versão de que “mais uma vez “a Igreja estaria sendo contrária ao desenvolvimento científico ao “tentar atravancar uma das maiores descobertas da ciência de nosso tempo”. É uma versão que se revela no mínimo falsa quando desconsidera integralmente as razões que motivam a Igreja a assumir essa posição, e pior, colocam que a Igreja é contrária a pesquisa como um todo, o que não é um fato, haja vista a Igreja é contrária tão somente à destruição de embriões humanos para a pesquisa.

A Santa Sé está convencida de que é necessário apoiar e promover as pesquisas científicas em benefício da humanidade. Por isso, a Santa Sé encoraja as pesquisas que estão sendo realizadas nos campos da medicina e da biologia com o objetivo de curar doenças e melhorar a qualidade de vida de todos, contanto que sejam respeitosas para com a dignidade do ser humano. Esse respeito exige que toda pesquisa que for incompatível com a dignidade do ser humano seja excluída por razões morais. As clínicas de reprodução humana que realização o processo de congelamento de embriões são co-responsáveis pela manutenção do embrião congelado. Segundo,está implantado no Brasil, um cadastro nacional destes embriões congelados (Sys Embrio) para regulamentar o seu uso ou não. Terceiro, TODA e qualquer tentativa de utilização do embrião em questão passa, obrigatoriamente, pela anuência do casal biológico. Acreditamos que o próximo passo é centrar as atenções na lei que regulamentará esta questão. Quarto, incentivar para que possa existir em nosso país uma legislação que regulamente as técnicas de reprodução assistida como acontece na Itália.

“Todos os embriões oriundos de técnicas de reprodução assistida deverão ser transferidos para a mulher”. Você sabia que no Brasil o número de embriões formados é, na média, um dos maiores que qualquer país das américas incluindo os Estados Unidos? Você sabia que somos “campeões” em número de embriões congelados?

Prof. Dr. Paulo F.
Taitson

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NOTA DA CNBB SOBRE A DECISÃO DO STF

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) lamenta a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que julgou a validade constitucional do artigo 5o e seus parágrafos da Lei de Biossegurança, n. 11.105/2005, que permite aos pesquisadores usarem, em pesquisas científicas e terapêuticas, os embriões criados a partir da fecundação in vitro e que estão congelados há mais de três anos em clínicas de fertilização.

A decisão do STF revelou uma grande divergência sobre a questão em julgamento, o que mostra que há ministros do Supremo que, nesse caso, têm posições éticas semelhantes à da CNBB.

Portanto, não se trata de uma questão religiosa, mas de promoção e defesa da vida humana, desde a fecundação, em qualquer circunstância em que esta se encontra.

Reconhecer que o embrião é um ser humano desde o início do seu ciclo vital significa também constatar a sua extrema vulnerabilidade que exige o empenho nos confrontos de quem é fraco, uma atenção que deve ser garantida pela conduta ética dos cientistas e dos médicos, e de uma oportuna legislação nacional e internacional.

Sendo uma vida humana, segundo asseguram a embriologia e a biologia, o embrião humano tem direito à proteção do Estado. A circunstância de estar invitro ou no útero materno não diminui e nem aumenta esse direito. É lamentável que o STF não tenha confirmado esse direito cristalino, permitindo que vidas humanas em estado embrionário sejam ceifadas.

No mundo inteiro, não há até hoje nenhum protocolo médico que autorize pesquisas científicas com células-tronco obtidas de embriões humanos em pessoas, por causa do alto risco de rejeição e de geração de teratomas.

Ao contrário do que tem sido veiculado e aceito pela opinião pública, as células-tronco embrionárias não são o remédio para a cura de todos os males. A alternativa mais viável para essas pesquisas científicas é a utilização de células-tronco adultas, retiradas do próprio paciente, que já beneficiam mais de 20 mil pessoas com diversos tipos de tratamento de doenças degenerativas.

Reafirmamos que o simples fato de estar na presença de um ser humano exige o pleno respeito à sua integridade e dignidade: todo comportamento que possa constituir uma ameaça ou uma ofensa aos direitos fundamentais da pessoa humana, primeiro de todos o direito à vida, é considerado gravemente imoral.

A CNBB continuará seu trabalho em favor da vida, desde a concepção até o seu declínio natural.

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Por que a Igreja é contra a pesquisa com células-tronco retiradas de embriões humanos?

Prof. Pe. Otávio Juliano de Almeida – Integrante do Conselho Arquidiocesano Pró-Vida

Em princípio devemos dizer que a bioética planta seus fundamentos numa base laica: ela não tem limites confessionais, ultrapassa a todas as religiões e delas não depende para sustentar-se. Ela tem base na Filosofia que é justamente a sustentação de qualquer discurso.

Em seguida devemos afirmar que a Igreja, anunciadora da mensagem do Cristo – o homem de Nazaré – quer dialogar sempre coma humanidade. Ela se sente impelida, constantemente, porque obedece ao mandato do seu Fundador. “Ide, anunciai a Boa Nova a toda Criatura”. (Mc 16,15).

Desta maneira, o cristão nasce inserido no mundo. “Não vos peço que os tire do mundo” (Jo 17,15).

O seguidor de Jesus precisa evangelizar o mundo. Não somos anjos. Muito menos somos et’s. A partir desta perspectiva precisamos dizer a todos que quando a Igreja defende posições éticas e morais determinadas, não se baseia simplesmente na fé sobrenatural, ou na Revelação divina vinda da Bíblia e da Tradição. A Igreja argumenta a partir de um substrato comum de HUMANISMO, gerado desde a matriz grega, quando Sócrates – pai da filosofia helênica – colocou o homem no centro do pensamento ocidental. Afinal de contas, em qual religião revelada tem num homem de carne e osso a própria encarnação do Deus invisível e onipotente?

Esta religião é o Cristianismo. Numa época em que somente vale a eficiência – único valor subsistente – empenhar-se pela dignidade do ser humano, de modo especial dos fracos, inocentes, dos improdutivos, dos esquecidos, torna-se ainda urgência para quem é de Cristo.

Aguda urgência! A maioria dos cientistas sérios afirma que a vida começa com a fecundação do óvulo com o espermatozóide. Temos indiscutivelmente nova vida. Ainda que não se desenvolva, não deixa de ser. Ainda que defeituosa, não deixa de ser. Porque nada será desta célula inicial, outra coisa que não seja um ser humano. Nenhuma mãe ainda deu à luz a um morango ou uma bela maça, certo? Na teologia cristã não existe alternativa entre Deus e o ser humano. Existe complementaridade e cumplicidade. Defender o homem é adorar ao Deus verdadeiro (Deus da Vida!) e adorar a Deus se faz exaltando o humano como amplitude da Criação. Não existe diferença. Existe tão somente uma relação de amizade. Deus vem ao encontro da criatura na pessoa do Filho

Único, nascido do útero de uma mulher judia, numa data determinada em uma cultura especifica. Encontro perfeito. Aliança refeita. Amizade selada. Doação sem medida.

O ser humano é imagem e semelhança de Deus (Gn 1,26). Não podemos, portanto INSTRUMENTALIZAR este homem. Significa escravizar. Significa tornar meu semelhante – imagem do Criador – um objeto a meu dispor. Possível é a pergunta: só porque o embrião ainda não pode dizer um sonoro ‘não’? A dignidade do ser humano se baseia na sua condição racional (Kant). O Cristianismo se apóia neste conceito porque a dignidade se torna vocação e realização na historia do ser humano. A condição histórica é a base da dignidade do ser humano. Hoje, nossa historia se encontra no entrave ou na encruzilhada de perceber que podemos manipular outros seres humanos. Isto deve nos questionar e fazer-nos rever nosso conceito do que seja verdadeiramente a humanidade.

O humano do homem está em jogo.

Negociar e transigir significa empobrecer sua dignidade, fundamentada e assentada justamente depois de centenas e centenas de anos de quedas, martírios, sofrimentos, descobertas, luzes e sombras. MANIPULAR O EMBRIÃO É REJEITAR E DESONRAR A HISTÓRIA. MANIPULAR O EMBRIÃO HOJE É PASSAR POR CIMA DE TANTOS HOMENS E MULHERES QUE SOFRERAM PARA CONSTRUIR NOSSO HOJE QUE ERA O FUTURO DE CADA UM DELES. Isto, certamente é absolutamente imoral. Enfim, a vida – na Natureza, mas também no ser humano – oferece uma excelente metáfora para compreender QUEM É DEUS. Todas as religiões relacionaram a defesa da vida com a vontade de seu deus. Adorar a Deus é exaltar a beleza e a inconfundível arte de viver! Saborear seus aromas no contato com o outro, mesmo quando o sabor da tolerância parece amargo ou meio ácido… Para que a dignidade do ser humano, sejamos príncipes ou plebeus, não seja desonrada nem ontem, nem hoje e nem nunca! *Integrante do Conselho Arquidiocesano Pró-Vida, Mestre em Teologia Moral pela Pontifícia Universidade Lateranense Vaticano),especialista em Ensino Religioso e Teologia Pastoral, professor de Moral na PUC Minas.

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